quinta-feira, 30 de abril de 2009

Prova de redação

_____Em 29 de abril de 2009, no colégio Nacional de Uberlândia – onde trabalho –, a amiga e professora Milena, de redação, apresentou, em sua prova bimestral, o seguinte exercício aos alunos:

Proposição para leitura e produção da Situação A

Considere o seguinte recorte:

“Andava pela rua quando de repente tropecei num pacote embrulhado em jornais. Agarrei-o vagarosamente, abri-o e vi, surpreso, que lá havia...”

Você deverá continuar o trecho acima em, no mínimo, mais dois parágrafos, constituindo um total de 15 linhas (desconsiderando a introdução)

Instruções específicas:

1. assinale a situação escolhida na folha de redação;
2. crie um título para sua narrativa;
3. copie a introdução; na sua folha de redação;
4. identifique-se adequadamente (nome, série e turma);
5. apresente um fundo moral para a sua narrativa.

_____Eu estava aplicando essa prova em uma das turmas e me deparei com essa tarefa. Achei interessante e desafiadora, talvez toda proposta de produção de texto o seja, e resolvi participar. Aí está o resultado:

Nome: Curtt
Turma: 2ª série do ensino médio
Situação escolhida: A

Titulo: É verdade!

_____Andava pela rua quando de repente tropecei num pacote embrulhado em jornais. Agarrei-o vagarosamente, abri-o e vi, surpreso, que lá havia – nu e cru – o corpo etéreo e transparente da verdade. Olhei para os lados e procurei a desconfiança nos olhos dos que passavam, mas percebi que todos estavam alheios a mim e seguiam o fluxo contínuo e automatizado de suas vidas.
_____Livrei a verdade do incômodo invólucro e deixei-a ali livre. A verdade flutuava junto ao meu peito, não se afastava de mim, seguia-me. Buscava um amigo, talvez. Deixei-me acompanhar, sentia-me diferente, feliz – Tinha encontrado a verdade!
_____A todos os lugares eu levava a minha companheira, as pessoas se impressionavam com ela, mas logo se afastavam. Os que a tocavam reclamaram de dor; os que não a tocavam disseram-se invadidos por um mal-estar, um incômodo.
_____A situação se agravou depressa: perdi meu emprego de jornalista – sugeriram que eu escrevesse contos de fadas –, perdi a vida social, minha família afastou-se. Ninguém reconhecia a minha verdade e viviam – só eu enxergava isso! – de falsas ou meias verdades. Os debates viravam conflitos; as discussões, desavenças; as amizades, contendas; o convívio, solidão.
_____Enfim, hoje ando sozinho pelas ruas, vivo do lixo e da esmola: de mim e da minha verdade, infelizmente, ninguém quer saber.
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Moral 1: a verdade às vezes dói, às vezes incomoda.
Moral 2: a verdade é companheira.
Moral 3: os jornais podem embrulhar a verdade.
Moral 4: talvez exista mais verdade num conto de fadas do que no texto de um jornal.
Moral 5: a verdade é minha.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Amim

... de nome e de sentimento. Um dia tomei consciência de que todas as minhas ações altruístas eram um exercício honesto e exclusivo do meu egoísmo: ajudava outros a encontrar a felicidade, mas visava ao meu próprio prazer. Decidi mudar. Concentrei-me em ajudar a mim mesmo e o meu prazer duplicou.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

_____Em Dom Casmurro, Capítulo LV, Um soneto, Machado de Assis faz ao leitor a seguinte provocação:

“Pois, senhores, nada me consola daquele soneto que não fiz. Mas, como eu creio que os sonetos existem feitos, como as odes e os dramas, e as demais obras de arte, por uma razão de ordem metafísica, dou esses dous versos ao primeiro desocupado que os quiser. Ao domingo, ou se estiver chovendo, ou na roça, em qualquer ocasião de lazer, pode tentar ver se o soneto sai. Tudo é dar-lhe uma idéia e encher o centro que falta.”

_____Obviamente, o autor faria quantos sonetos quisesse com os dois versos que criou:

“Oh Flor do céu! Oh! Flor cândida e pura!”, o primeiro do poema;
“Ganha-se a vida, perde-se a batalha.”, o verso final – a “chave de ouro”.

_____Fazer sonetos lhe seria fácil, mas o seu jogo era provocar, manipular as vaidades humanas, o seu prazer era fazer com que outros realizassem o que ele fingiu, com ironia e deboche, estar além da sua capacidade. Machado de Assis era um gênio, um bruxo.
_____Sim, ele está morto, mas suas genialidades e bruxarias estão vivas, por aí: o número de desocupados que encheram “o centro que falta” se aproxima, talvez, da casa do milhar, logo não serei “o primeiro”, mas, sem dúvida, mais um que se rende às manipulações machadianas.

SONETO

“Oh Flor do céu! Oh! Flor cândida e pura!”,
de celestes olores, de magia,
nessa doce prisão – doce clausura! –
a minha vida agora principia.

Oh! Flor do céu! Oh! Flor que me captura
os desejos. Seu olhar me desafia,
com dissimulações, com fantasia,
e da ressaca rompe-se a ternura.

Oblíquo, Capitu, é esse seu olhar
de mulher, de menina, de cigana;
ingênuo, tolo, deixo-me arrastar

pelo fervor que o olhar – tão seu – emana.
– Beije-me, Capitu! Que o amor me valha:
“Ganha-se a vida, perde-se a batalha”.

sábado, 18 de abril de 2009

Máquina mortífera

_____Strangerson era um cidadão logófago, alimentava-se de palavras, literal e vorazmente: seu corpo hidratava-se com a seiva discursiva de uma prosa consistente e elaborada, por isso frequentava simpósios, congressos e participava de qualquer conversa em que das palavras brotasse um fluido energizante e criador; lia compulsivamente os clássicos, os gênios da literatura universal, os teóricos e a crítica especializados; seu corpo se fortalecia com o novo e com o fundamento.
_____O óbvio entediava-o; o blá-blá-blá e a mesmice em diálogos eram o seu tendão de Aquiles. Exposto a eles por um tempo prolongado, morreria por inanição.
_____Strangerson tinha lá os seus caprichos, sentia prazer em implodir as colunas da certeza com sua acidez implacável e contundente. Seu discurso minava os argumentos com avidez e racionalismo instintivos, inatos e incontroláveis.
_____Por isso tinha inimigos, muitos: os que viviam do “lugar comum”, os que enriqueciam com a pregação das falsas verdades, os que reescreviam o reescrito e tantos outros seres e suas vacuidades maravilhosas.
_____Strangerson foi capturado. No cativeiro, submeteram-no à exposição continuada da programação televisa. Foi vítima da crueldade. Imobilizado, tentou resistir, mas a sucessão de programas degenerou sua mente e roubou-lhe a vitalidade corpórea. Sem consciência, seus olhos perderam o movimento e fixaram-se na tela; a partir daí a morte foi rápida: sem a capacidade de filtrar informações, entrou em transe e atingiu a catatonia. Nesse momento, começou Big Brother Brasil: não teve chance – nem precisava tanto! –, foi o golpe de misericórdia.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

Depoimento

Não falarei da sua beleza incontestável,
embora a sua não seja efêmera como as outras são;
Não direi nada de suas conquistas:
sei que elas vêm em consequência dos seus esforços,
da sua dedicação e de seu talento;
Não! recuso-me a falar do sorriso, encantador por essência,
e que vela um temperamento forte e determinado;
Não falarei de nossos laços familiares,
porque não somos laços: somos nós górdios;
Não vou falar da mulher, linda e sincera, que ora nasce para o mundo;
O que direi, porque quero dizer, se resume em duas palavras:

amo você.

sábado, 4 de abril de 2009

Poema Infantil 3

Peças à beça
e quebra a cabeça
– Cabe essa! –
o moleque brada,
de quebra, a peça
do quebra-cabeça.